Os que se pensam Iguais ostentando o rótulo de “Normais”
tem horror a ver sua padronização resultante de sua busca por similaridades no
espelho que nós Autistas mostramos a eles. Faz parte da Natureza deles tentar
encontrar a si nos outros e encontrar pontos
em comum buscando identificarem-se uns com os outros no procedimento da
interação social. Isto ocorre por que existe uma crença há muito arraigada, de
que só é possível a interação social se ambas as partes forem semelhantes entre
si e que a cooperação social só se faz
mediante o corte das diferenças buscando alcançar um padrão comum teórico-é a
busca da “Normalidade”.Assim, o chamado “consenso” nada mais é do queo brutal
corte das aparas e arestas para aparências , opiniões, pontos de vista, para o
bem da concordância, quanto mais iguais forem, pensam eles, mais eficientes
ficam as relações sociais e a própria
Sociedade.
E por que buscam uma igualdade?Pelo mesmo motivo que
os Autistas buscam seu Mundo Interno de Fantasia: Previsibilidade!
A Previsibilidade é segura, é confortável, é cômoda,
então, se um “Normal” encontra outro “Normal” e o segundo “Normal” age , reage
e se comporta como espera o outro “Normal” (e como esperam todos os demais “Normais”
também), ou seja, de forma considerada pelos “Normais” como “Normal”, sabe-se
exatamente o que esperar dele e pode se planejar a reação do primeiro do
jeitinho que a Sociedade espera que ele reaja.Isto dá aos dois, e a todo o
resto, uma sensação de segurança, de saber até onde se pode e deve ir, com o
conforto da certeza de que não terá surpresas nem improvisos. Até parece que
estou falando de Autistas, não?Mas estou falando aqui de normotípicos!
Não são então parecidos, cada um a sua maneira? São,
claro que são, oras, tudo isto é naturalmente...Humano !
Porém, esta similaridade, esta padronização, é uma
ilusão, é uma busca impossível de ser alcançada, pois o Ser Humano é
extremamente Diverso em sua Natureza.
E os Autistas, também tem sua busca? Tem ! Mas,
embora possa se assemelhar na questão da busca de uma Identidade, é diferente,
por que é uma busca pelo Diferente, ou melhor, é mais complexo que isto, é
buscar nas Diferenças suas semelhanças.Parece ilógico, sem sentido, incoerente,
non sense talvez? Não é uma busca para encontrar a si no outro, mas encontrar
no outro uma identificação com uma Natureza em comum, a Natureza Autística,
que, paradoxalmente, embora se expresse e se mostra com tamanha diversidade e
variedade, existe algo nela, subjetivo mas intrínseco, que os une, com a qual
se identificam e pela qual sabem que não estão lidando com um “normal”, mas com
outro Autista- e este algo mais, este detalhe, varia intensamente de indiivíduo
para indivíduo, mas de algum modo, nós sabemos , sentimos, quem é Autista e
quem não é.
As pessoas não autistas estão tão acostumadas a serem “normais”
(e “normalizadas” pelas demais) , que isto para elas é normal, foram assim condicionadas pela sociedade.
Então não entendem nosso orgulho de
sermos diferentes, e eles nos chamam de normais achando que é elogio, por entre
eles e no meio deles é elogio mesmo.
Mas não para nós, para nós é ofensa !
Na verdade não entra na cabeça
deles como alguém pode achar ofensa ser chamado de normal, pois eles tentam inutilmente
encontrar em nós mais um deles, inclusive porque a busca deles tem como
componentes importantes a vaidade e o ego- e a nossa , não. Não procuramos as
pessoas para nos compararmos a elas afim de satisfazer o ego e a vaidade. Não
que não tenhamos , claro que temos, somos humanos como todas as outras pessoas,
mas para nós não tem a mesma dimensão de importância, embora isto também varie
muito.
Estão então
os normotípicos acostumados a se verem refletidos uns nos outros,só não somos
reflexos deles, não existimos para refletir de volta a eles o ego deles, nem
para sermos comparados com eles.
O que os deixa com raiva é que
refletimos a similaridade deles e não um reflexo de como se interpretam; e
mais, subversão das subversões: mostramos a eles que é possível ser diferente!
E que é possível um relacionamento harmonioso entre diferentes sem necessitar
de cortar aparas, de moldagens, sem precisar ser colocado e se encaixar dentro
de fôrmas sociais para a interação dar certo. Parece paradoxal, inconcebível,
mas é possível a cooperação sem um consenso imposto ao qual se adaptar!
Isto rompe totalmente com a
mentalidade de culto as similaridades, expõe a Ditadura da Normalidade a quem
eles servem, mostra como os mecanismos sociais ralmente funcional e-mais
temido- mostra que eles não funcionam como se fora alardeado, e que este
funcionamento pode ser bem cruel e nada belo, revelando os sacrifícios pessoais
que foram necessários para se chegar aos resultados desejados pela Sociedade, e
que nem sempre coincide com as necessidades pessoais de cada pessoa. Aparar
arestas, cortar rebarbas, se anular ou mesmo se rejeitar, mas mal, muito mal, e
pode-se estar sendo feliz achando que , apesar de tudo, se está sendo feliz. Amarga
Ilusão !
Então, sempre existem normotípicos
que tentam nos enquadrar tentando nos convencer que sejamos iguais a eles nos
chamando de normais, fingindo que não percebem nossa diferença, mas percebem- e
sempre há os que a invejam!
Tudo isto me faz lembrar uma cena que o grande
Joseph Campell descreveu em sua série “O Poder do Mito”, em que ele presenciou
uma família tendo uma refeição em um restaurante, e em que o pai disse para a mãe na presença do filho:
“-Eu sofri muitíssimo no meu passado, na minha vida,
do mesmo jeito que meu pai sofreu,, meu avô, meu bisavô, por que só meu filho
não pode passar pelo mesmo que nós passamos?Por que só ele tem de ser diferente
de todos nós, se tudo o que passei foi passado de geração em geração!Eu sou
como meu pai e ele tem de ser como eu sou !Por que eu olho para ele e vejo a
mim como criança ! Assim como meu pai me viu, meu avô viu meu pai, e assim por
diante...Então, eu não entendo, por que ele não pode ser como eu?”
Isto diz muito de como muitos normotípicos nos
veem...
Cristiano Camargo
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