Autismo: a vez da voz dos filhos !
Algo que me faz diferente de tantos outros ativistas pelo Autismo nas
comunidades espalhadas pelo Face, é que procuro tentar ser muito mais a
voz dos filhos do que a voz dos pais.E felizmente, outros filhos e
filhas autistas tem seguido e trilhado este caminho também.Mas , por
que?
Pais e mães de Autistas que falam pelos filhos e que expressam suas dificuldades, preocupações e angústias, já existem muitos, são a maioria absoluta que compõem as Comunidades de Autismo nas redes sociais.
Mas o principal motivo não é este.
É porque considero que é muito importante para os pais ouvirem a voz de
seus filhos e dos filhos dos outros.Prestar atenção ao que os filhos
autistas tem a dizer é muito importante, e muitas vezes o caminho para
as superações dos filhos está nos recados a que eles tem a
transmitir.Penso que é importante que os filhos autistas tenham suas
vozes ouvidas, opinião própria e suas próprias hipóteses sobre o
Autismo, afinal, ,como são autistas, podem falar do assunto com domínio e
propriedade.
Claro que muita gente gostaria ou só se interessa em
ouvir depoimentos e histórias de vida, e ficassem só nisto e não
tivessem idéias próprias. Mas ei, pode estar nas idéias próprias dos
filhos autistas a saída para as preocupações maternas e paternas, o
caminho para uma aceleração do desenvolvimento, para as superações !
Então, por que não ouvi-las?
Eis que pois, muitos pais e mães não suportam nada que não for
interpretado por eles/elas como apoio e incentivo, mas, alto lá, pais e
mães são humanos,e como todo mundo, podem errar. Ou podem estar no rumo
errado sem saber,e podem precisar que alguém lhes abra os olhos para
lhes mostrar novos caminhos , novos rumos na educação dos filhos, que
podem ser tomados.Mudar de idéia não é ter culpa. Mostrar novos caminhos
não é culpar. Mostrar onde se está errando é um ato de amor.
Não é
apontando os erros aos filhos que eles ensinam os filhos a não errar
mais?Como vamos aprender a não errar, como aprenderemos com os nossos
erros, se não soubermos que erros foram estes, sem saber onde erramos, e
em quê?
E por que não os filhos apontarem os erros dos pais também?
Afinal, os filhos, especialmente depois de adultos, tem uma grande
bagagem de experiência como filhos e sabem como foram criados (que nem
sempre é como gostariam de terem sido) e sabem como gostariam de ser
criados. E quem, antes de ser pai e mâe não tem mil planos de como vão
educar os filhos como forem?Estes planos nasceram de suas experiências
como filhos, pelo que viveram e pelo que observaram dos pais. E muitos
não querem cometer os mesmos erros e repeti-los de geração a
geração.Enquanto os pais criam, os filhos os observam e vão anotando
tudo o que os pais fizeram que os filhos interpretaram como erros que
poderiam ter sido corrigidos,e bolam soluções. São erros que os filhos
não chamaram a atenção durante a criação por, em certos casos, excesso
de severidade e autoritarismo (“-Não responda para mim !Me respeite!”), e
aí, tolhidos de seus direitos ‘a opinião própria, não puderam ajudar os
pais na época. Mas , se por um lado, ter pais muito severo não deixa
que os filhos tenham sua voz para ajudar aos pais, para estes filhos
ajudarem outros pais é bem mais tranquilo, pois deixa de ser uma relação
de autoridades e comandados, o que confere aos filhos mais liberdade de
ação e expressão.
Então, só elogios e apoios explícitos, rasgações
de seda e alimentos para ao ego e a vaidade dos pais e mães pode não os
estar ajudando, pode até estar atrapalhando, porque mascara os problemas
e os erros. E muitas vezes, também a crítica pode ser um ato de amor,
um ato de solidariedade, o importante neste caso é não ficar na simples
crítica, mas mostrar soluções. E não há como mostrar soluções sem
mostrar os erros.Acertos não ensinam nada, erros ensinam tudo a quem
estiver disposto(a) a deixar o orgulho, o ego e a vaidade de lado e
aprender.
Tem gente que vê nos apontamentos de erros, críticas e no
apontar de soluções uma culpabilização dos pais? Tem, e muita ! Mas tem
razão?
Não, por que não cabe culpa nas criações dos filhos, nem nos
comportamentos de pais e mães.Buscar culpas não leva ninguém a nada de
bom. Procurar culpas em críticas , idem.
Os filhos autistas não
falam para acusar nem culpar ninguém. Falam para procurar ajudar aos
demais pais e a outros filhos, o objetivo é sempre o desenvolvimento e
as superações.
E um filho autista não fala por si só, representando apenas seu próprio caso, como muitos pais de autistas os acusam.
Muitos erros são comuns em muitas criações diferentes e precisam ser
apontados. E , embora existam milhões de autismos diferentes, muitas
coisas eles tem em comum entre si, ou não seria todos eles chamados de
Autismo. Você pode ter muitas marcas de carros, sedans, peruas, picapes,
esportivos, jipes, conversíveis, com “n” configurações diferentes de
motores, etc, mas todos tem em comum quatro rodas, bancos, parabrisas,
volante, etc. O mesmo se aplica ao Autismo, só que com uma variabilidade
infinitamente maior e com a humanidade que uma máquina não tem, mas
algumas coisas em comum todos tem, e estas formam sua Identidade, a
Identidade Autística.
Então dá para um autista falar de tudo o que
se refere a Identidade Autística falando por e para todos os demais
Autistas. Por que isto, apesar de diferentes, eles tem em comum.
Então, por fim, é por tudo isto que sigo tentando ser uma voz de filho autista, e falar para os filhos.
E é por tudo isto que é importante não deixar só que os pais falem por
seus filhos ou por todos os filhos, sozinhos. Os pais não estão sozinhos
no mundo.E os filhos tem voz, querem e precisam se expressar e mostrar o
que pensam , o que sentem, o que vivem.E acima de tudo, querem ajudar.
Não só a eles, mas aos pais também.
Que tal ouvirem o que temos a dizer?
Cristiano Camargo
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