domingo, 30 de abril de 2017

A Guerra da Sociedade contra o Autismo




“Ele/Ela está superando o Autismo”- Será mesmo? A Guerra da Sociedade contra o Autismo !


Quando se supera, não é o Autismo que está sendo superado. Autismo não é algo ruim, para se superar. Pelo contrário, é o Autismo quem leva o Autista a superar. Esta balela de "está superando o Autismo" parte de um falso e discriminador pressuposto de que o Autismo imponha barreiras na vida dos Autistas para eles superarem. Na verdade é a sociedade quem impõe barreiras para o Autista superar e é o Autismo que ajuda o Autista a superar as barreiras da Sociedade contra o Autismo e contra o Autista. Na verdade, ao ver alguém diferente, como o Autista, a Sociedade aciona seu alerta vermelho e cava trincheiras, e coloca muralhas e arames farpados na frente do Autista e o ameaça com os morteiros do Preconceito, com a artilharia pesada da Discriminação, com as granadas da recusa das qualidades do Autismo, com os mísseis da Patologização do Autismo, com as metralhadoras da recusa em reconhecer o direito do Autista em ser independente e Autônomo, com os canhões da exclusão escolar, com os tanques de guerra da exclusão do mercado de trabalho, com os aviões de caça da Infantilização Intencional e Proposital de Autistas tendo como pilotos certos Doutores Mengeles da Psiquiatria ensandecidos berrando “-Doentes!Transtornados!” com seus DSM´s  e CID´s nas mãos; Enfim, a Sociedade há muito tempo declarou guerra ao Autismo, e nem se deu conta de que, com isto, declarou guerra aos Autistas também. É uma guerra que os Autistas tem de enfrentar todos os dias e que é unilateral, porque nós Autistas nunca a declaramos, foi a Sociedade que declarou, considerando-o um inimigo da sociedade a ser excluído, infantilizado e mantido prisioneiro da dependência eterna. Sem mesmo julgar, ou mesmo pré-julgando, a Sociedade já nos condenou, e tenta executar a pena a que nos sentenciou. Nós Autistas somos apenas as vítimas que tentam se defender e mostrar que não somos inimigos e que sim, apesar de toda a ingratidão da Sociedade para conosco e nossas contribuições para Sociedade,nós temos sim com que contribuir e queremos contribuir para tornar um pouco menos doente esta sociedade enlouquecida. E nesta luta, nossos pais e nossas mães precisam ser também soldados a engrossar nossas fileiras e lutar ao nosso lado nesta guerra, para nos ajudar a vencer- qualquer adição de forças é bem vinda !

Cristiano Camargo

terça-feira, 25 de abril de 2017

Autismo: A séria questão do Preconceito social contra o não olhar nos olhos



Autismo: A séria questão do preconceito social contra  o

não olhar nos olhos







 Há séculos, quiçá milênios, existe na humanidade ,ou seja, nas sociedades por todo o planeta, um forte preconceito contra não olhar nos olhos.
Há quem diga, por exemplo, que quem não olha nos olhos não inspira confiança, não tenha caráter, e, recentemente cheguei mesmo a ver uma postagem no face alegando que a Oxford University, da Inglaterra, orientando seus alunos no sentido de dizer que : “pessoas que não olham nos olhos seria um ato racista”.
Mas voltando ao assunto que é matéria deste artigo,e, voltando ao Brasil, fica muito clara a desconfiança do público quanto a não olhar nos olhos, desconfiança esta que expressa  e destila o mais sério preconceito.
Quantas pessoas que olham nos olhos e não tem caráter?Quantas pessoas não  mentem para outras olhando nos olhos?Quantas pessoas não fazem as mais terríveis crueldades olhando nos olhos?Muitas, incontáveis!
Então por que esta “tradição” milenar, esta acepção tão imbuída e cristalizada  nas tradições populares, de que quem não olhe nos olhos não mereça confiança?
Enquanto o povo nega a quem não olhe nos olhos o direito ‘a confiança e honestidade, nas ciências psiquiátricas/psicanalíticas, este preconceito é expresso de outra forma, não menos cruel , mas igualmente fria e insensível: elas tratam o “não olhar nos olhos”  como se este fosse um sintoma, uma limitação, uma grave barreira para o desenvolvimento, a maturidade, e, principalmente, para a sociabilidade.
Será o gesto de não olhar nos olhos tão importante assim? Será a relação interpessoal dentro da sociedade tão baseada assim em algo tão prosaico e sem importância?Será que a sociabilidade e o sucesso dos indivíduos depende tanto assim de olhar nos olhos, se tal gensto é tão traiçoeiro e já provou ao longo dos séculos que não funciona, que não é um indicador confiável de caráter e confiança como a tradição alega? Não seria tal desconfiança uma falácia hipócrita?  
Aqui então cabe falar um pouco das razões psicológicas de Autistas não olharem nos olhos:
Por milênios a humanidade tem usado o olhar nos olhos como uma ferramenta de dominação, autoridade, severidade, de autoritarismo. As pessoas que dominam as outras pelo olhar são admiradas e cultuadas pela sociedade- eis que pois, apesar de toda a crítica, as sociedades adoram uma ditadurazinha e um autoritarismo, embora isto não possa ser generalizado, ou não teríamos os contestadores,os revolucionários, os que lutam pelo Estado de Direito, Constituição e Democracia- E as que são dominadas pelo olhar e oprimidas por ele, ninguém fala, nem admira, são taxadas de doentes, fracas, inconfiáveis, traiçoeiras, quando, no geral dos casos, isto nem um pouco corresponde ‘a verdade, ‘a realidade. Puro preconceito.
O olhar nos olhos também é visto pela sociedade como uma maneira de tentar se impor o respeito e de enfrentar as pessoas, já que muitas vezes as relações humanas são vistas não como relacionamentos democráticos, civilizados, horizontais, mas como a mais vertical das competições.
As pessoas que se olham nos olhos estariam se medindo uma á outra e tentando estabelecer o lado da dominância para dizer quem manda e quem obedece., e quem não olha nos olhos não estabelece esta relação de dominância, já está dominado, é inferior, e covarde, por que foge do enfrentamento e das medições de forças. E isto é uma falácia das mais desonestas, uma sociedade que viva de inter-dominâncias é uma sociedade doente!
E na maioria esmagadora das vezes, não olhar nos olhos não tem nada a ver com covardia ou potencial de traição, muito menos com falta de caráter. Se é preciso se auto-afirmar perante o outro e perante a sociedade para conquistar seu respeito, que deveria ser natural e  não condicional, então vivemos numa sociedade não apenas doente, mas imatura e infantilizada, e aí poderemos considerar que não olhar nos olhos seja uma atitude madura  e adulta, mais consciente e civilizada, posto que mais sensível.
Mas, perguntariam certamente vocês, por que raios Autistas não olham nos olhos?
Talvez a maior razão seja esta que acabou de ser citada:uma questão de sensibilidade e poética.
O Autista é um ser contemplativo por natureza, observador de si mesmo e do mundo que o cerca, em que o olhar também o leva para outros mundos, outras dimensões que só ele vê e vive quando quer.Assim, ele recusa esta exigência irracional de medir forças, competir pelos olhos, estabelecer relações de dominância e submissão.
Como sabemos, o Autista é um insubmisso por natureza, seu senso de liberdade e autossuficiência emocional estão acima dos relacionamentos .Para o autista, as relações interpessoais não são as prioridades e sim, sua liberdade e autonomia pessoal para exercer sua contemplação.Por sua própria natureza, ele odeia  a exigência de relações de dominância e competição na sociedade, pois o Autista não vive para competir, vive para si mesmo, o Eu focado no Eu.
Eis que pois, então, o Autista pode não estar olhando nos olhos como um ato de rebeldia ao Sistema. Ou também, como Autistas são muito diferentes entre si, por evitar olhares severos e autoritários, que eles temem e odeiam.
Mas muita gente pode dizer: mas eu não “fuzilo” o Autista com meu olhar, eu procuro transmitir amor, carinho, meiguice, eu não entendo...
Aí é que está a questão. Não importa a sua intenção ou como você interpreta o que você faz, mas importa mesmo para o Autista é a interpretação do que ele entende do que você faz. Para ele, a interpretação dele é que importa, por mais que você jure de pés juntos que a interpretação dele esteja equivocada, que não tenha nada a ver. Você pode pensar o que quiser, mas como ele vê, como ele pensa e como ele interpreta é o que realmente importa para ele e ele vai agir e interagir baseado na interpretação dele, não na sua. Ele tem o senso próprio dele, muitas vezes ele nem usa o senso comum, a lógica é outra.
Assim, é bastante comum, especialmente nos Autistas que tem famílias as quais o Autista interpreta como sendo severas e autoritárias(mesmo que elas mesmas achem que não sejam), evitar o olhar nos olhos-muitas vezes eles tem traumas psicológicos inclusive de infância por conta de experiências assustadoras e opressoras com olhares nos olhos-como mecanismo de autoproteção contra novos traumas e más experiências de vida que influenciem de modo maligno suas sensibilidades, destruam seus sonhos, etc.
É verdade que muitos Autistas com o tempo acabam olhando nos olhos, mas ,sinceramente? A Sociedade vê isto como uma vitória, uma superação, eu, diferentemente desta interpretação, vejo como uma simples adaptação a um ambiente hostil, abrindo mão de parte de seu jeito de ser para ser aceito-algo injusto, não acham?
Então, não penso que devamos exigir de nossos filhos que nos olhem nos olhos, eles tem suas razões para isto e deveríamos respeitá-las.Se olharem um dia, ok, mas se não quiserem, não devemos pressionar, ficar estimulando (muitas vezes os autistas interpretam os estímulos como sendo uma forma de pressão disfarçada), e sim, compreender e respeitar, ao invés de encarar isto como se fosse desconfiança, imaturidade, sintoma, doença, deficiência, limitação.
Mesmo por que, depois de muitos anos de ter o não olhar nos olhos como hábito arraigado, é difícil a gente mudar isto por dentro e fazer esta adaptação, este modelamento ao que a sociedade caprichosamente (no pior sentido)quer.
Para compreender e incluir, devemos crescer. E para crescer, muitas vezes precisamos nos libertar de velhas tradições arraigadas e malignas, como o preconceito contra não olhar nos olhos!

Cristiano Camargo
                                                    

sábado, 15 de abril de 2017



O Perigoso caminho da genialização de Autistas:

 
 
 
 
 
Existem algumas crianças, ou mesmo adolescentes/adultos Autistas que o público "elege" com gênios. Quem recebe este duvidoso título passa a ser alvo de exigências de seu público cada vez mais insanas, espectativas verdadeiramente desumanas, que tocam as raias da dimensão divina, desumanizando assim o Autista. E se ele não corresponder, com o passar dos anos, 'a estas espectativas monstrouosas, faraônicas construidas pelo público em volta dele, este público, na maior crueldade, o acusará de ser uma fraude.Sabem, "genializar" as pessoas é uma maneira de tirar delas a humanidade , mas o oposto, é outra maneira de desumanizar pessoas. Quando vc nega a alguém o direito de errar, e exige dela que ela seja a genialização que as pessoas fizeram dela, para estas pessoas que estão pedindo de modo insano uma correspondência a esta genialização,a pessoa nem errar precisa mais, basta não corresponder aos castelos que as pessoas construíram dela nas cabeças delas.As espectativas acabam ficando tão absurdas, e com elas, o nível de exigência do público, que a pessoa perde para este público sua humanidade, pq humanamente não há como corresponder a esta histeria coletiva, este circo construido em volta da pessoa, em que a pessoa NÃO pediu para construírem, foi algo espontâneo.Se a pessoa não corresponde 'a sua espectativa e você se decepciona com ela, quem se decepciona é vc, não ela.O errado é quem construiu as espectativas exageradas, não quem foi alvo delas.Quem foi alvo foi na verdade uma vítima do circo que fizeram em volta dela, mas hey, ela nunca deixou de ser humana e nem deixará só pq algumas pessoas querem! Vamos valorizar a humanização, a dimensão humana das pessoas e procurar ver quem é a pessoa humana debaixo do mito que se fez dela.Não que esta pessoa não mereça sua fama e seu prestígio- ela não merece é o que certas pessoas fazem com a fama e o prestígio dela, para usarem esta fama e prestígio como armas contra ela, desumanizando-a, exigindo dela o que sabem que ser humano algum seria capaz de corresponder, e tentando desconstruir, ou mesmo destruir a pessoa como se esta fosse a culpada pelo exagero de expectativas que outros criaram em cima dela, por inveja, vingança, ego ferido, sei lá...mas ninguém pode ser culpabilizada pelo que os outros fazem contra ela, isto é absurdo, é fascista, esta é a mentalidade fascista que existe em chamar alguém que já foi chama(a) de gênio passar a ser chamada de fraude...
 
Cristiano Camargo

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Autismo e o brincar fora da caixa:o absurdo da poda da criatividade no brincar infantil



Autismo e o Brincar fora da caixa : o absurdo da Poda da Criatividade no brincar infantil




 No início dos anos 70, quando eu era bem criança, eu montei uma pequeno automóvel  com um brinquedo de armar semelhante ao Lego, chamado Hering-Rasti, que tinha complexos sistemas de suspensão, com molas  e tudo, e um sistema de direção semelhante ao de carros de verdade. Também a estrutura da carroceria mais parecia feita por um engenheiro, tamanha a complexidade, e isto aos 9 anos de idade. E não era só isto, eu fazia aviões, navios, carretas com articulação que funcionava e naves espaciais.
Hoje, terapeutas analisam o modo com que a criança brinca como ferramenta para determinar o diagnóstico, e elegem um rígido, estreito e limitado padrão de brincadeiras infantis que eles consideram ser os adequados, e qualquer coisa que escapar desta padronização, será considerado um “brincar inadequado” e “passível de intervenção”.
Oras, “inadequado” para quem , cara-pálida?
É muita presunção e onipotência querer ditar autoritariamente do que uma criança possa brincar e do que não possa, querer impor apenas uma maneira de brincar e elegê-la como perfeita, referência, padrão, adequada e querer que todas as crianças brinquem sempre do mesmo jeito, com sempre as mesmas brincadeiras.
O brincar é uma conduta, um comportamento? É!
Mas, se na minha época, um doutor viesse me dizer que não era assim que se deveria brincar, e tentasse me forçar a brincar apenas do jeito que ele queria, porque ELE considerava tal brincadeira a “adequada” para mim (sem nem levar em conta se eu iria gostar ou querer  de brincar do jeito que ele queria), e matasse assim a minha criatividade, só por que a minha brincadeira precoce e diferente o ajudou a me diagnosticar Asperger, quem eu seria hoje? Nunca teria sido um escritor, nem desenhista, talvez no máximo um burocrata infeliz...
Tem gente que acha que só porque na caixa está escrito que o Leo é para fazer um caminhãozinho, é para a criança fazer um caminhãozinho igualzinho o da foto da caixa, ou será diagnosticado doente, com alguma síndrome ou transtorno. Percebem a mentalidade patologizante da Psiquiatria? Querer transformar a criatividade natural e inocente de uma criança numa patologia?
Depois me perguntam por que sou contra o diagnóstico precoce, e porque eu sempre considerei que foi uma bênção para mim ter sido diagnosticado apenas aos 41 anos de idade !
Não, a Psiquiatria precisa aceitar o “brincar fora da caixa” como saudável e salutar, como algo natural, que advém da própria Natureza do Autismo. Esta autonomia e liberdade criativas do brincar fora da caixa, de ser alegremente fora dos padrões, esta liberdade subversiva ao sistema que Autistas adoram e que é sua essência de ser, sua alma, não pode ser punida. Nem “corrigida” por intervenções. Autistas não podem nem devem serem limitados pelos terapeutas para se encaixar em padrões, sob pena de comprometer seu desenvolvimento e sua maturidade.
O meu eu só pude ter chance de desenvolver por que meu pai nunca tentou limitar minhas brincadeiras quando eu era criança e me deixou livre para brincar como eu quisesse. Meu pai foi sábio, obrigado, pai, por sua atitude, eu não seria quem sou hoje se o senhor não tivesse me compreendido tão bem e visto o óbvio e me concedido a liberdade criativa que eu precisava para liberar meu podenticail.E ele é um neurocientista. E acho que a Ciência Psiquiátrica deveria seguir o exemplo dele,(E outros pais e mães também) e ver no brincar fora da caixa algo natural, mais do que isto, um potencial para o desenvolvimento, um potencial para trabalhar e desenvolver, não uma patologia a ser corrigida, eliminada; pois a criatividade autista, minha gente, é nela que está a chave para o desenvolvimento dos Autistas desde crianças , para se tornarem adultos de sucesso !
Vamos então pensar fora da caixa e deixar nossos filhos brincarem fora da caixa e exercerem suas criatividades na hora de brincar?

Cristiano Camargo !