sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

A falácia da expressão "Autismo de verdade"

Infelizmente, tem sido cada vez mais comum adultos(as) Autistas serem acusados de  não serem "Autistas de Verdade", como se, para a Sociedade, ou pelo menos para certas pessoas fundamentalistas nas Comunidades e Grupos sobre Autismo, fosse preciso bater a cabeça na parede, abanar as mãos, não falar verbalmente  e se morder, cortar e se autoflagelar, e sair espancando todo mundo que vê pela frente, ou "não é Autista de Verdade".
Nada mais psicofóbico e preconceituoso, discriminatório mesmo, do que esta falácia do "Autismo de Verdade". Uma falácia que prejudica imensamente a Imagem Pública Positiva do Autismo e dos Autistas, e que os expõe a ainda mais estigmas sociais e preconceitos, portanto, prejudica diretamente tanto ao Autismo como aos Autistas.
Pois, para poder existir um "Autismo de Verdade", é preciso existir um "Autismo de Mentira".
E quem pode , quem tem o Poder, para estabelecer e julgar  o que é, e quem é "Autista de Verdade " e "Autista de Mentira"? Quais os critérios? Em que se baseiam?
Quem será o Juiz desta causa inócua e falaciosa? Os Psiquiatras? Os Pais? Os Professores? Os demais profissionais das áreas relacionadas?Os Políticos? Os juristas?
E por que os próprios Autistas não clamam a si próprios como "Autistas de Verdade" e não chamam outros de "Autistas de Mentira"?
Oras, esta questão posso responder: Por que já somos Autistas, e não precisamos ficar nos afirmando desta maneira tão pueril ! Sabemos quem somos, como somos e o que somos e não temos dúvidas neste ponto, somos seres conscientes e autoconscientes, por menos que a Sociedade queira reconhecer por puro preconceito.Afinal, o Autismo não é apenas uma Diferente Natureza de Ser que faz parte da Diversidade Natural Humana, é uma forma de ver o Mundo Real capaz de perceber as pequenas grandiosidades da Vida e da Realidade, que não Autistas ou não se dão conta, ou nem prestam atenção, ou nem tem a sensibildade para apreciar e entender, achando que sejam meros detalhes e não lhes atribuindo sua verdadeira importância, enfurnados numa visão de mundo tacanha e estreita.
A própria imensa diversidade do Autismo em si  já desautoriza  e desacredita o conceito de "Autismo de Verdade".
Sim, mas a Sociedade, ah, a Sociedade, esta sempre tenta impor ao público, seja através do Cinema, seja através da televisão, ou das Redes Sociais, a imagem de que ou o "Autista de Verdade " seja um Rain Man, um "Khan", um " Atypical",etc, ou  um doente desumanizado, um diagnóstico com duas pernas, um aríete humano(???) que não fala nem falará nunca, que fica girando rodinhas, se balançando, se machucando e espancando quem vê pela frente, sem meios termos.
Ah, mas existe muito mais Diversidade no Autismo do que sonha a vã Psiquiatria !
Somos, no mudo todo, quase 195 milhões de Autistas, então, são dezenas e dezenas de milhões de Autismos totalmente diferentes entre si e incomparáveis entre si, inclassificáveis, incategorizáveis, e não apenas esta pobreza miserável e simplista, preconceituosa de apenas 3.
A Genética já vem apontando milhares de "alterações", ou seja, diferenças, no genoma autístico em relação ao de neurotípicos, mas a Psiquiatria sozinha não pode tentar entender o Autismo desvencilhada da Genética Molecular.
A grande questão é que, a visão patologizante do Autismo tende a interpretar estas "alterações" como se fossem anormais, desordens, disfunções, perturbações, mas elas são naturais, então não são patológicas/doentias, são parte da Diversidade Genética Humana. Ser Autista é tão natural e saudável como eu ser eu e você ser você.
É uma visão distorcida dos artigos científicos, que em nenhum momento afirmaram ou autorizaram esta interpretação desonesta.
Portanto, ninguém pode sair por aí pré-julgando/pré-conceituando o que seja "Autismo de Verdade", isto é uma grande mentira, uma grande falácia!
E estereótipos cinematográficos/televisivos, ou ainda dogmáticos sociais não podem servir de critérios para julgar quem é Autista e quem não é, muito menos para julgar quem é "Autista de Verdade" ou "Autista de Mentira".
Não podemos restringir a Diversidade Humana a fôrmas sociais e estereótipos, nem nos reger por preconceitos, discriminações, muito menos ficarmos criando Castas Mentais ao categorizarmos/classificarmos Autistas. Autistas não são diagnósticos, são gente real, de carne e osso e não são inferiores a ninguém, nem menos eficientes ou menos executivos. Apenas sua eficiência se expressa de uma miríade de formas diferentes, que se rebelam contra a padronização de comportamentos que tanto agrada a Sociedade.
Para uma Sociedade mais diversa e democrática, é necessário que a Sociedade se flexibilize e se adapte ao Autismo, pois somos uma minoria cada vez mais numerosa e representativa, antes silenciosa, mas cuja voz só agora começa a ser ouvida pela Sociedade.
Nosso Clamor é o de que nossa Inclusão não é um favor, mas um Direito a ser respeitado e praticado, que a dignidade do reconhecimento de nossa humanidade, de nossa libertação do código de barras feito prisão pregado na testa que tenta nos impor uma condição humilhante de meros diagnósticos com duas pernas.Não temos que nos mutilar como pessoas humanas, não temos que mutilar nosssas Naturezas, para sermos o que a Sociedade julga como se fosse "Autismo de Verdade".Não, não temos esta obrigação.
Mas a Sociedade como um todo sim, tem obrigação moral de nos incluir como somos, e não como gostariam que fôssemos.Por que se a Sociedade só incluem quem é "Igual a todo mundo"? / "Pensa/Se comporta igual a todo Mundo" , ela não inclui, ela exclui , discrimina e marginaliza.
E Genetica, Paleontologia, Antropologia estão aí para comprovar: quem suprime a diversidade genética e comportamental, corre céleramente na direção da inexorável extinção.
O sucesso evolutivo e existencial está na Diversidade, ela foi , é, e será sempre a chave da Sobrevivência da Humanidade como espécie, cultura , civilização e sociedade.
Então, não pensemos mais em "Autismo de Verdade" ou "Autismo de Mentira, ou quaisquer rótulos pseudocientíficos sem qualquer embasamento na genética molecular.Pensemos em Autismo, simples assim, em todo o explendor maravilhoso de sua gigantesca diversidade. Pensemos na Neurodiversidade. Pensemos na Visão Positiva do Autismo, e sejamos felizes incluindo como velhos amigos queridos,em nossas vidas e em nossa Sociedade, nossos filhos e alunos, e cidadãos Autistas!

Cristiano Camargo






Nenhum comentário:

Postar um comentário